Talvez tudo o que tenhamos garantido seja a viagem. E dá medo. “A viagem – o grande panda e o pequeno dragão” (editado pela Iguana), de James Norbury, é uma pedra preciosa capaz de individualizar cada cor quando as filtra no seu interior.
Esta parábola delicada é aberta a cada pessoa e consegue ser única para cada uma. O migrante poderá ver-se na desventura destes dois amigos que saem de uma casa que já viu melhores dias. Deixam quase tudo para trás, deixam objectos, sítios onde cresceram, amigos, motivados pela necessidade de recomeço. Esta viagem poderá ser vista como uma relação que deixou de completar e cujas ruínas mostram o desconforto.
Se optarmos pela psicanálise, são tese e antítese, são o antagonismo entre necessidade de previsibilidade e sensação de incompletude. Estaremos melhor onde não estamos? De uma forma mais generalista, somos nós em constante viagem, amarrados por medos e motivados por aquela centelha de coragem que nos leva a dar mais um passo e depois outro e outro até o medo ficar para trás. O contraste é evidente: um dragão, pequeno e com o fogo da inconstância dentro de si, e um panda, sapiente por já ter errado mais (e aprendido com isso). A paciência do panda amaina o medo do dragão.
A nota do autor dá ao leitor algumas chaves de leitura. Podemos ver que, nos momentos positivos, a palete de cores é mais viva, e os personagens caminham da esquerda para a direita; ao invés, quando os obstáculos os fazem cair e o peso do medo parece ser demasiado, as cores esbatem-se, e caminham da direita para a esquerda. Nesta história para todas as idades, sai a alma confortada, e lembramo-nos de que nesta viagem comum a todos, não estamos sozinhos.
Publicado em: https://comunidadeculturaearte.com/a-maravilhosa-viagem-de-james-norbury/
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