Com um discurso lento, ponderado, por vezes contraditório, Rachel Cusk (n.1967) demonstrou muita cautela durante a conversa com a Comunidade Cultura e Arte [CCA], em Matosinhos, durante o “LeV- Literatura em Viagem”. O seu instinto de defesa está mais alerta depois de comentários muito agressivos da imprensa inglesa. Os seus dois principais trabalhos — ainda não traduzidos para português — valeram-lhe o epíteto de “The first literary bad mother”. “A Life´s work: On Becoming a Mother” e “Aftermath: On Marriage and Separation” são perturbantes abordagens ao divórcio e à maternidade. A utilização da vida privada como matéria literária é partilhada por autores como Ferrante, St Aubyn e, principalmente, Knausgaard, por quem a autora demonstrou admiração.
Mesmo com críticas mais direccionadas para si, Cusk viu o seu trabalho reconhecido pela crítica literária. A sua voz destacou-se e as nomeações para os prémios literários viriam a acontecer. Os seus livros estiveram na “shortlist” do “Man Booker Prize”, do “Folio Prize”, “Bailey´s Prize” entre outros.
Em Portugal, “Arlington Park” e “A Contraluz” foram traduzidos e publicados.
“A Contraluz” (Quetzal), sobre o qual a autora inglesa falou com a CCA, marca uma mudança de registo. Publicações como “The Guardian”, “The Telegraph” e “The New York Times” louvaram o primeiro livro de uma trilogia que acompanhará a vida de Faye, personagem principal. “Transit”, segundo volume, foi recentemente publicado em Inglaterra.
Faye é, tal qual Rachel Cusk, uma predadora de histórias. Durante a sua viagem para Atenas, sob um calor intenso, a narradora vai ouvindo e escrevendo as histórias contadas por quem com ela conversa.
As diversas vozes vão formando uma narrativa fragmentada sobre o amor, a solidão, a família, a perda. “A Contraluz” diverge de anteriores obras, pois o “eu narrativo” esconde-se no silêncio e pouco se dá a conhecer. Faye, uma escritora que vai dar aulas de escrita criativa na Grécia, está ali para ouvir…
Qual é a sua relação com a ficção? Existe uma linha entre ficção e “não ficção”?
Nos meus trabalhos iniciais, existia uma linha. Agora possivelmente não existe. São formas diferentes, mas com processos semelhantes. Por vezes, escrevia na forma de autobiografia porque estava a falar das minhas experiências. Essa forma ajustava-se ao que estava a escrever. Agora estou muito menos interessada nessa distinção entre formas.
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