O Primeiro-Ministro e
os antipsicóticos
Há
muitos anos que tenho a possibilidade de dar aulas de português para
estrangeiros. Os alunos são, maioritariamente, pessoas que fugiram a situações
de pobreza no seu país paterno.
Chegam
sozinhos, sem família.
Têm
uma grande divergência de habilitações entre si. São licenciados ou de
escolaridade mínima. Assim que entram em Portugal isso pouco interessa.
Trabalham na construção civil, nas limpezas, em pequenas lojas, na mercearia
onde compro fruta ou, simplesmente, podemos vê-los no Pingo Doce de Entrecampos
a receber e agradecer a comida que lhes dão. Fazem o que nós não queremos
fazer. Estão na situação em que não queremos estar.
Há um outro tipo de aluno que não vem em fuga, mas vem porque a empresa o destacou para Portugal. São quadros directivos, estagiários sem família ou colaboradores com filhos. Saíram de uma vida estável e entraram numa vida estável.
Não
vêm sozinhos. Trazem a família.
Felizmente,
a remuneração por eles auferida permite que um dos cônjuges se demita e traga
os filhos. As crianças são inscritas em excelentes escolas e depressa atingem o
grau de mestria em Língua Portuguesa. Os colaboradores são uma mais-valia para
as empresas e admirados pela sociedade.
A
maior parte dos alunos faz um enorme esforço físico e financeiro para aprender
português. Os cursos são pagos por eles e não pelas empresas.
Tive
a felicidade de estar presente perante um aluno moldavo que escreveu uma carta,
contextualizada por um exercício formativo, em que dizia que quando tinha
chegado se sentia um bebé. Não tinha amigos, não sabia a língua, não sabia onde
iria dormir e só tinha a mochila que trazia às costas. A família, mulher e um
filho, havia ficado na Moldávia.
Tinha caído desamparado num mundo estranho.
Tinha caído desamparado num mundo estranho.
Um governo que promove a emigração dos cidadãos, independentemente das suas habilitações, é composto por pessoas que vendem ilusões. E não sei o que é mais grave, se uma mentira credível, ou uma psicose que empurra terceiros para uma decisão indesejada.
Não nos iludamos. A maior parte da emigração pertence ao primeiro tipo. A família fica em troco da promessa de dignidade.
Acredito que a família é a base de todos os afectos. Seja ela monoparental, composta por dois elementos do mesmo sexo, ou tradicional, a família é um pilar social. Se somos obrigados a hipotecar esse pilar então estamos em acentuada decadência civilizacional.
Seja contra uma ideologia ou episódio psicótico é imperioso resistir. Não somos crianças e dispensamos o paternalismo. Não somos imbecis e não aceitamos ilusões. Não somos máquinas e não aceitamos a instrumentalização. Somos homens e mulheres. Somos pais e mães.
Mário Rufino
Máriorufino.textos@gmail.com
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